Eu não conheço a Marta. Sei que é amiga de um novo amigo que fiz, recentemente, no Porto, quando fui à Almedina. A Marta tem um site que é www.havidaemmarta.blogspot.com. Vou lá todos os dias. Há pouco tempo percebi que a Marta tinha colocado a capa de "O Silêncio de Deus", excertos do livro, e havia notas e comentários. Uma das notas é maravilhosa e aqui a deixo, depois dos excertos que a Marta escolheu. Ela anda a preparar um jantar de abrótea com maionese de toranja, exactamente o prato que o escritor Manuel Guerra rejeita logo no início do livro. É maravilhoso que haja quem se dê ao trabalho de ler os livros e perceber paladares ao mesmo tempo. Bem haja!
« [...] No Santo Sepulcro não sentes nada. Eu não senti nada. As pessoas beijam uma lage que foi ali colocada no princípio do século XIX. Beijam a laje como se ela fosse o local exacto onde o corpo de Cristo foi depositado. Não acredito. As diferentes igrejas de índole cristã disputam o espaço do Santo Sepulcro, há uma custódia repartida, como se o espaço fosse uma criança e as igrejas os seus pais separados. Chamam-lhes Status Quo. Para que não haja lutas e desavenças as chaves do Santo Sepulcro, duas chaves, foram entregues a duas famílias muçulmanas há novecentos anos. Todos os dias, às cinco da manhã, abrem a porta velha e vão à sua vida, deixando os peregrinos e os padres fazerem a sua. Regressam às sete e fecham a igreja da discórdia.
É aqui também que se crê estar o Centro do Mundo, simbolizado por uma bacia com água. Olhei-a longamente e, aí sim, senti que perante aquela bacia tosca, de pedra velha, podia estar uma ideia maior que o Homem. O centro do mundo deveria concentrar tudo o que temos de melhor. Os turistas acotovelam-se para ver. Os franciscanos cantavam qualquer coisa. E eu fiquei ali. Queria tanto entender[...].Chegas ao Muro. Homens do lado esquerdo com os kippa na cabeça, mulheres do lado direito. As mulheres são muito novas. Andam de trás para a frente e enfiam o rosto no «Livro das Lamentações» e não lêem, debitam, e é um choro constante que impressiona e arrepia. Os cânticos fúnebres, kinot,enchem-me os olhos de lágrimas. Lembro-me da minha mãe. Saio da zona do Muro às arrecuas, para não ofender a Deus.
Deixo um recado no Muro. Trabalhei nele uma noite inteira. Não sabia o que dizer. Escrevi: Perdoa-me, devolve-me a paz que tinha quando estava no teu regaço, no seio da minha mãe. Deixa-me. Encontra-me. Não posso continuar assim. Ouve-me hoje. Ajuda.me amanhã. Não sei se acredito. Não te minto. Mas hoje ouve o meu coração e junta-o ao teu [...].
Nota 1. da Marta [excertos do e-mail que Sara envia à sua amiga Madalena, dando-lhe conta das suas impressões sobre o que viu e sentiu em Israel]
Nota 2 da Marta. [livro a ler até 11 de Julho, data agendada para o jantar-tertúlia-abrótea-com-maionese-de-toranja. Senhoras e senhores é favor lerem :) Gracinha, eu já sei que o tens...alguém ofereceu ;)]